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sobre a pesquisa: zonas fronteiriças

Sobre a pesquisa: zonas fronteiriças: escrita, desenho, pesquisa e docência em arte em deslocamento, desenvolvida como trabalho de graduação no curso de Licenciatura em Artes Visuais na UFES, sob orientação da Profa. Dra. Julia Rocha.



Tentarei escrever este texto relembrando um pouco o momento da apresentação e espero que dessa maneira consiga fazer um bom panorama do que produzi nesta pesquisa.


Eu estava nervosa, a semana tinha sido bastante cheia, concomitantemente estava me preparando para apresentar o TG, montar a exposição dos desenhos que fazem parte da pesquisa, receber a minha família, comprar materiais, buscar folhas, fazer impressões, enviar e-mails, ir às aulas, trabalhar, comprar uma camisa,comprarcopos,conseguirfalarbem,tirarumanotaboa,comemorardepois,abraçaraspessoas,sorrir,ficarfeliz,ficaraliviada, etcetcetcetcetc enfim, estava me preparando para muitas coisas que aconteceriam num só dia, estava acelerada, sem saber se deveria estar confiante, já sabendo que a voz vez ou outra iria embargar, mas eu sabia o que tinha feito, afinal é bem provável que essa pesquisa seja a coisa mais minha que tenho. Estava tudo ali, nas páginas, essas quais as professoras da banca tiveram acesso e me animava poder dialogar com elas. Naquele momento eu precisava tornar aquelas palavras grafadas em fala e presença.





Eu havia convidado alguns amigos para assistir e a minha mãe - que se deslocou do leste de Minas até Vitória para isso -, tê-los ali me alegrava e me emocionava muito. A sala estava cheia, muitos outros alunos da graduação também ocupavam as cadeiras de plástico marrom e ferro preto, em volta de mesas grandes de madeiras laminadas com algum material verde musgo. Aquela imagem me tomou, tive vontade de desenhar. Mencionei as cores porque compunha bem, mas o que dava sentido àqueles móveis era o fato de que estavam preenchidos por pessoas que objetivavam algo em comum: me ouvir.


Comecei minha fala me apresentando e me situando dentro das relações que tinha com as pessoas ali presentes, importa dizer que sou filha da Raine, amiga da Luísa, da Mariana e do Leon, aluna da Margarete e da Gilca... porque tudo isso de alguma forma influenciou na construção da pesquisa. Por isso também iniciei lendo a minha dedicatória:

Dedico este trabalho às crianças, sobretudo à

que fui e que ainda me acompanha.


Às crianças porque um dos pontos de partida da minha escrita foi a experiência de estágio na Educação Infantil e a partir disto e de leituras comecei um processo de rememoração de vivências na educação básica que tive como aluna e retomo esses momentos como um meio de discutir desenho, docência e até mesmo o ofício de escrever. É dessa processualidade que surge também a escolha de minha epígrafe:


O que terei eu para te dizer com a escrita? O que terei eu para te dizer com o desenho? Talvez desenhar e escrever sejam os assuntos em si. (Sofia Barreira)



Esse trio de duas indagações e uma meia afirmação compreende tanto os assuntos que tratei quanto a forma com que os considerei dentro do trabalho. Foi escrevendo que pude discutir sobre a escrita de forma poética e inventiva e foi desenhando que pude expandir o grafismo até as discussões sobre educação e formação num curso de licenciatura em Artes Visuais e trazê-lo para a pesquisa também como um meio de reflexão tão importante quanto a escrita. Para registrar esses percursos e suas ramificações organizei a pesquisa em ensaios; verso sobre as experiências de estágio que tive na Educação Infantil e no Ensino Fundamental elaborando sobre a construção de planos de aula e vendo esta tarefa de forma criativa, como um modo de inserir uma poética dentro dos planejamentos do ensino de arte.



Busco tratar os assuntos de maneira muito próxima pois compreendi que esta pesquisa poderia ser uma forma de entender a minha formação como professora e como poderia tratar da minha produção artística e da docência como planos permeáveis, para isso me apoiei na A/r/tografia de Rita Irwin (2008). Escrevo com muita sinceridade, pontuo sensações, o tempo da escrita, as minhas dúvidas e receios e, com isso, busco pessoalizar o Trabalho de Graduação. Traço paralelos entre o percurso que tenho até então com o desenho e o que foi iniciado com a escrita, a docência e a pesquisa, nesse processo utilizei como referência textos acadêmicos, mas também literatura, música brasileira e, sobretudo, as minhas vivências dentro da educação básica desde a infância até aqui.


Terminei minha apresentação e fiz questão de mencionar o quanto era importante estar ali sendo vista por muitos, era algo que eu buscava desde que consegui deixar de ser sutil dentro da escrita, me colocar e reconhecer a potencialidade que existe em falarmos de nós mesmos de forma direta e utilizando das nossas experiências como uma maneira de validar nossas subjetividades e alcançar outros indivíduos. Falei sobre ter sido uma criança que desviava da heteronormatividade e sobre querer ser uma professora que irá considerar os estudantes como interlocutores, unidades de uma construção coletiva que é o ensino. Assim, compreendendo a poética, a educação e a pesquisa como zonas fronteiriças é que pude construir este trabalho. Considerando as subjetividades desses processos dentro de suas relações e na busca por pares em minhas leituras, encontrei em mim também a potencialidade de pensar mudanças. Traçar relações horizontais nos espaços escolares - como um meio de ao menos tecer micropolíticas - me parece ser um bom primeiro passo para tentar conflagrar as fissuras dessas estruturas tão solidificadas.






referências:

BARREIRA, Sofia Moura Pinheiro. O que me fez o desenho? Do não desenhar ao escrever: será para isso que serve também desenhar, ter pretexto para escrever? 2016. Tese (Doutorado em Educação Artística). Universidade do Porto - Faculdade de Belas Artes. Porto, 2016.

IRWIN, Rita L. A/r/tografia: uma mestiçagem metonímica. In: AMARAL, Lilian; BARBOSA, Ana Mae. Interterritorialidade: mídias, contextos e educação. São Paulo: Senac Editora, 2008.


sobre a autora:

Julia Ramalho é artista visual e graduada em Licenciatura em Artes Visuais pela Universidade Federal do Espírito Santos (UFES). Dentro de sua produção explora a linha contínua no desenho como expansão do gesto e tem interesse de pesquisa no campo da docência-artística. É membro do Grupo de Pesquisa Entre - Educação e Arte Contemporânea (CE/UFES).

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